Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-geral do PCP

Intervenção de Jerónimo de Sousa no Comício na «Voz do Operário», em Lisboa

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Intervenção de Jerónimo de Sousa, no Comicio da Candidatura de Francisco Lopes à Presidencia da República

As eleições presidências são neste momento uma importante frente do combate que travamos pela ruptura e pela mudança e em defesa dos interesses vitais do nosso povo.

Um combate que exige de nós, a partir de agora e à medida que se clarifica e formaliza o quadro das diversas candidaturas, um crescente empenhamento para dar à nossa candidatura, à candidatura do camarada Francisco Lopes a dinâmica, a força, a expressão de massas que a projecte como a candidatura dos que não se rendem, nem capitulam perante os objectivos e a chantagem dos grandes interesses e poderosos e do seu projecto de exploração dos trabalhadores e dos povos.

Um combate que se integra e articula com a luta que os trabalhadores e as massas populares desenvolvem contra a ofensiva da política de direita no nosso país e contra os interesses do capitalismo e do imperialismo que na Europa estão a impor a sua lei – a lei do mais forte – para submeter os povos aos interesses dos grandes potentados económicos e das grandes potências. Por isso esta candidatura também é uma candidatura de um combate mais geral que se trava em várias frentes e em relação às quais precisamos igualmente de dedicar o máximo do nosso esforço e a nossa melhor atenção.

Temos, de facto, pela frente duros combates, tão duros quanto assistimos à mais brutal das ofensivas destes últimos anos, pela acção concertada do governo do PS e do PSD e que tem na proposta do Orçamento de Estado para o próximo ano mais um instrumento de extorsão dos trabalhadores e das populações.

Duros combates que se desdobram, como desejamos e precisamos, numa forte e determinada intervenção eleitoral, numa imprescindível acção militante de apoio ao desenvolvimento da luta de massas que aí está também, com a marcação da Greve Geral pela CGTP-IN e as grandes manifestações e lutas já anunciadas, particularmente a manifestação da Administração Pública do dia 6, mas também dando uma atenção dedicada à luta que se trava no seio das instituições com denúncia e com proposta para minorar os efeitos da política de desastre social e nacional que tomou conta do país.

Nós temos confiança e a certeza que estaremos à altura de travar esses duros combates. Temos confiança que o camarada Francisco Lopes, na sua experiência, na sua dedicação à causa dos trabalhadores e das populações, na sua comprovada capacidade forjada em anos e anos de luta em defesa dos interesses do nosso povo e do país, fará mais que a parte que lhe compete! Então, ganhemos mais confiança na intervenção e capacidade do nosso colectivo partidário e em todos os democratas que estão connosco neste combate eleitoral e nas diversas frentes em que lutamos.

O país e os portugueses que trabalham e sofrem as consequências de uma crise para qual nada contribuíram, vivem hoje e acompanham com grande preocupação a perspectiva de uma ainda maior e acelerada degradação das suas condições de vida com as propostas e medidas contidas no Orçamento do Estado para 2011.

À medida que se aprofunda o conhecimento sobre a proposta do governo de Orçamento de Estado para 2011, mais se confirma que estamos perante um Orçamento brutalmente injusto do ponto de vista social e que do ponto de vista económico inevitavelmente contribuirá para acentuar o declínio do país e o agravamento de todos os problemas nacionais.

Um Orçamento de grave regressão social, com drásticas medidas de austeridade que são um autentico roubo aos rendimentos, ao poder de compra e condições de vida dos trabalhadores, dos reformados, das camadas populares e intermédias da população portuguesa, que aprofunda a injustiça fiscal existente com o aumento do IRS e do IVA, que fragiliza o sistema de protecção social, debilita a resposta dos serviços públicos de saúde e de educação e que promoverá uma nova vaga destruidora de empregos e da nossa capacidade produtiva.

Um Orçamento que concretiza uma política de desastre social e nacional que já mostrou que só tem acrescentado crise à crise e injustiça às injustiças criadas por anos consecutivos de governos do PS e do PSD/CDS-PP.

Um Orçamento que concretiza o conjunto de propostas acordadas nos PEC entre PS e PSD com o patrocínio de Cavaco Silva e que são a marca de água deste Orçamento, concebido para o povo pagar a factura de uma crise que o grande capital económico e a especulação financeira criaram e da qual continuam a tirar as máximas vantagens e proveitos.

Um Orçamento que corta de forma brutal nos salários da administração pública e nos trabalhadores do Sector Empresarial do Estado, mas que atinge igualmente os rendimentos dos trabalhadores de todos os sectores. Ninguém escapa! Ataca todos os pensionistas e os reformados, sem excepção, mesmo as mais baixas pensões. O emprego e os direitos dos trabalhadores. Que atinge de forma cega as camadas da população mais fragilizadas, mais desprotegidas e mais carenciadas, nomeadamente os desempregados, os beneficiários do rendimento social de inserção, os mais idosos, os doentes, as crianças, os excluídos.

Um Orçamento que impõe novos cortes no abono de família, nas comparticipações nos medicamentos e vai promover uma quebra acentuada do poder de compra de largas massas, não apenas pela redução dos rendimentos dos trabalhadores, do golpe no IRS, mas também por um novo aumento do IVA, da energia, dos transportes, preços dos serviços públicos e das taxas do Estado. O denominado Estado social é para o PS cada vez mais um enfeite, um adorno para colorir e compor o seu discurso político.

Um Orçamento que se traduzirá também numa nova ameaça à sobrevivência de milhares de micro, pequenas e médias empresas, designadamente com a penalização do consumo interno, de mais uma quebra brutal do investimento público e de novas restrições nas transferências para as autarquias. Sacrifícios e mais sacrifícios para os mesmos de sempre, enquanto mantêm intocáveis os privilégios dos do costume, enredados num conjunto de mistificações que importa questionar.

Três grandes mistificações saltam à vista à volta deste Orçamento que a propaganda governamental tenta credibilizar.

A primeira mistificação é a que pretende fazer crer que este é um Orçamento equitativo que põe a pagar de igual forma os rendimentos do trabalho e do capital e que apenas atinge o poder de compra e os rendimentos de quem mais ganha ou ganha acima de 1.500 euros. Bastaria ver o conjunto das medidas para ver que estamos perante a mais completo logro. É aos rendimentos de trabalho e às prestações sociais que se pede mais de 90% do esforço total das medidas, pela via da redução dos salários, dos impostos ou do valor das prestações. Os baixos rendimentos são igualmente penalizados, incluindo directamente nos salários. Acenaram com o anúncio do imposto sobre a banca. Mas sabe-se agora que o máximo dos máximos que se lhes pede são 150 milhões de euros, um pequeno contributo comparado com os 5.200 milhões de euros que se pedem aos salários, à protecção social, saúde e segurança social. Uns trocos!

A segunda mistificação é que este Orçamento é inevitável. Que é a única solução. Trata-se de outro descarado embuste. Nem este Orçamento, nem a política que o suporta são únicos e inevitáveis! Com a consciência que sem ruptura e mudança não há solução duradoura, no estrito âmbito da política Orçamental, o PCP apresentou vinte medidas que não só reduziriam substancialmente despesa desnecessária ou supérflua, como ampliariam a receita sem aumentar a carga fiscal já muito pesada sobre os trabalhadores, os reformados e sobre os micro e pequenos empresários. Medidas para começar finalmente a tributar rendimentos e lucros que hoje não pagam impostos. Lucros que agora começam a ser anunciados e que ofendem os portugueses que estão e vão ser esbulhados. Outro Orçamento era e é possível!

A terceira mistificação é a de que sem este Orçamento, ficaremos sem acesso ao crédito, que sem este Orçamento os mercados estrangularão o país com taxas de juro leoninas. Este é o grande argumento para sustentar também a inevitabilidade deste Orçamento. Chegam a dizer com cara séria, como o fez recentemente um banqueiro, que ninguém gosta deste Orçamento, mas que este é necessário! Procuram fazer crer que eles também não gostam mas que sem a sua aprovação será a catástrofe! É uma evidência que este Orçamento lhes é muito útil. É o seu Orçamento e, por isso, dizem que é necessário.

Na verdade é preciso que se saiba que os mercados têm bilhete de identidade. São nomeadamente os bancos, da Alemanha, da França e da Holanda. A especulação sobre a dívida pública, com as taxas de juro de agiotagem que estão a praticar acabavam de imediato se estes bancos não tivessem a conivência dos governos das grandes potências ou se o Banco Central Europeu tivesse outra política.

Admitiu-se que o Banco Central Europeu, naquilo que chamaram medidas não convencionais, conceda créditos a 1% apresentando estes como "garantia" a dívida dos respectivos Estados. E que estes bancos, por sua vez concedam crédito aos Estados a 4, 5 e 6%! Vão buscá-lo a 1% e emprestam-no a 4, 5, 6%. O que é isto senão agiotagem e da mais pura? Onde é que está então a solidariedade europeia e o famoso princípio da "coesão económica e social"? E perante isto o que faz a Comissão e o presidente da Comissão Europeia que por acaso até é português? Ajudam à chantagem sobre o nosso país, como fez Durão Barroso ao reafirmar que este Orçamento tem que ser aprovado!

O que se está a passar com a Grécia, Irlanda, Portugal e Espanha é um processo de clara rapina, um processo de neocolonialismo, é a agiotagem ao serviço do capital financeiro, europeu e nacional. A agiotagem com a cobertura do directório das grandes potências e do presidente da Comissão Europeia. Agora é sobre o défice orçamental e amanhã perante a recessão a que nos vai levar este Orçamento, será sobre a falta do crescimento económico. E tudo isto vem dos países que mais têm ganho com o Euro e com o mercado único, como é o caso da Alemanha que agora com a arrogância de grande potência já nem disfarça a dominação e pretende exigir mais sanções para os chamados "Estados faltosos", rever tratados, impor o seu governo económico dito europeu com novas ameaças à soberania nacional.

Quando se tratou de ir em socorro dos banqueiros, de Barroso a Sócrates, de Merkel a Cavaco Silva, de Passos Coelho a Teixeira dos Santos, nenhum pôs em causa o défice, nem a despesa pública, pelo contrário, todos incitaram e aplaudiram que se usassem os dinheiros públicos como é exemplo claro o escândalo do BPN. Depois de se entregarem milhões dos impostos de quem trabalha ao capital financeiro e de se aplicarem milhões a tentar contrariar a recessão vêm os mesmos dizer hipocritamente que tais défices são inaceitáveis.

Perante a chantagem e as práticas neocoloniais o que se exige de um governo e de um Presidente da República que defenda o interesse nacional é que na União Europeia não se tenha um papel de submissão mas que se diga basta. Basta de roubo, basta de agiotagem! Que não se diga, como Cavaco Silva e o governador do Banco de Portugal, que os bancos são os donos da bola ou que não devemos insultar os bancos e as empresas de notação. Não se trata de insultos, trata-se sim de denunciar a hipocrisia e a natureza de classe das medidas.

Portugal precisa de um Orçamento que promova o aumento da produção nacional e o emprego e não o definhamento nacional e a entrega às garras dos especuladores. Portugal precisa de uma política de afirmação nacional e não de submissão e claudicação. Portugal precisa de um Orçamento e de uma política ao serviço dos portugueses e do país e não ao serviço dos banqueiros.

Estas três mistificações têm tido como pano de fundo essa bizarra dramatização e o empolado conflito público entre PS e PSD à volta da negociação com vista à sua viabilização do Orçamento.

Um conflito para encenar profundas divergências que não existem. Para criar a ilusão que estamos perante projectos alternativos e contradições insanável. Para credibilizar o rotativismo governativo que, nestas últimas três décadas, afunilou o país num único sentido que o conduziu ao atraso, ao desastre social, ao empobrecimento da vida política, da vida e social e económica e à dependência.

Na verdade, não há divergência de fundo entre PS e PSD. Aliás hoje voltaram a sentar-se à mesa do Orçamento. Ambos os partidos estão de acordo com o rumo que é proposto neste Orçamento, como estiveram no PEC. Essa identidade e convergência estão igualmente bem patente no conteúdo das sete medidas apresentadas pelo PSD ditas de viabilização do Orçamento.

As suas propostas coincidem no mesmo propósito de cortes nos salários e nos direitos dos trabalhadores, nas prestações sociais, no subsídio de desemprego e o congelamento das reformas, os mesmos cortes na saúde, na educação, no investimento e no emprego e na salvaguarda e manutenção de isenções, benefícios e mordomias para os grandes interesses económicos e financeiros, no banquete das privatizações que este Orçamento lhes garante. Mas, como se viu, também de acordo com o aumento do IVA para 23% que trocavam por uma proposta de fragilização financeira do sistema público de Segurança Social, como o pede o grande capital, particularmente as seguradoras que há muito espreitam o negócio da sua privatização.

O que está em causa no continuado conflito público a que assistimos, com a acentuação da dramatização à volta da aprovação do Orçamento são questões laterais, não são medidas de fundo, nem propostas alternativas, nem tão pouco põem em causa o fundamental medidas propostas pelo governo.
Temos o dever de alertar aqueles portugueses que, defraudados com o PS, pensam em apoiar o PSD mas que acabarão mais cedo que tarde por sentir nas suas vidas não só o que o PS propôs mas o que o PSD aprovou!
Muito do dramatismo que acompanha este Orçamento tem como objectivo incutir na opinião pública a ideia da inevitabilidade das medidas e é motivado pelo tacticismo partidário e pela tentativa de branqueamento e desresponsabilização da política e dos responsáveis que conduziram o país à situação de dependência em que se encontra. PS e PSD querem o mesmo orçamento que querem os bancos e o grande capital, mas cada um com o menor dos custos eleitorais possíveis. PS joga o jogo que muito bem conhece e que levou a apresentar esta proposta de Orçamento. Que os mesmos interesses que impuseram as opções deste Orçamento, o imporão também ao PSD que está condenado a aprová-lo e, por isso, puxa a corda da vitimização e do partido patriótico. Só que o PSD deseja e quer aprová-lo com o mínimo de custos possível, porque acha que perante estas draconianas medidas o poder lhe cairá nas mãos. É por isso que a ruptura das negociações entre PS e PSD é mais um acto de uma ópera bufa, que terá como epílogo a viabilização do Orçamento.

Uma nova encenação que abre espaço à projecção do candidato da “cooperação estratégica”, que aproveita a circunstância para num ápice continuar a promover o “consenso da desgraça e da ruína do país” que incentivou, ao leme da Presidência da República nestes últimos cinco anos. Desse país que, dizia em 2005, estar predestinado a salvar e não salvou, antes deu força às opções que conduziram o país para a crise.

Esse candidato que, em 2005, dizia estar muito “atento ao governo”, mas, afinal apenas para acentuar, o pendor direitista dos governos de José Sócrates e desequilibrar ainda mais a balança da governação a favor dos poderosos. Convida-nos agora, com a mesma empáfia dos predestinados, a que nos interroguemos “em que situação se encontraria o país sem a sua acção intensa (…) que desenvolveu ao longo do seu mandato” sem os seus “alertas e apelos” e os “compromissos que estimulou”. Desde muito novos nos habituámos a ouvir que “presunção e água benta cada um toma a quer”. Cavaco Silva tomou uma dose muito exagerada!

Cavaco Silva acaba, ufano, de se apresentar aos portugueses como se não tivesse nada a ver com o rumo que o país levou e leva, seguindo o exemplo de Sócrates, fazendo jus ao ditado que a culpa deve morrer solteira. Mas não vão ser precisos, afinal, os seus préstimos de fazedor de compromissos. O PS, depois de dizer o que disse de Passos Coelho, prepara já uma nova proposta para o PSD, para regressarem às negociações ornamentados e envolvidos no manto do interesse nacional. Hoje já acertaram o passo! Desse interesse que os poderosos habitualmente chamam a si quando precisam de garantir o seu domínio e os seus interesses. Porque se o interesse nacional fosse o interesse do nosso povo, este Orçamento estava chumbado ou jamais teria existido!

A vida tem vindo a mostrar que as políticas de direita do PS e PSD sozinhos ou concertados entre si ou com o CDS e colaboração dedicada de Cavaco Silva, não resolvem nenhum dos problemas do país. O fracasso das suas políticas e a dramática situação nacional confirmam a necessidade de uma ruptura e de uma mudança, que concretize uma política patriótica e de esquerda.
O país precisa de inverter a gravíssima situação de crise, de desemprego, de injustiças, de endividamento e dependência externa em que se encontra. O país não pode continuar a hipotecar o seu futuro. O país não pode continuar a adiar a tarefa do crescimento económico, da criação de emprego, da defesa e desenvolvimento da produção nacional.

Portugal pode e deve vencer mas com outra política, uma política ao serviço do povo e do país e não no interesse de meia dúzia de famílias, governantes e grandes grupo económicos.

Portugal pode e deve vencer apoiando esta nossa candidatura, a candidatura de Francisco Lopes, uma candidatura dos trabalhadores, dos que não aceitam o Portugal das desigualdades sociais e das injustiças e que lutam e aspiram à concretização em Portugal de uma democracia simultaneamente política, económica, social e cultural.

A candidatura que afirma a necessidade de um novo rumo para o país no respeito pelo legado da Revolução de Abril. Que não acordou agora para a greve geral nem para a luta que a insere na sua acção, intervenção, mobilização e nos seus objectivos.

Uma candidatura para combater a resignação e o fatalismo, afirmando convictamente que Portugal não está condenado ao atraso e ao subdesenvolvimento.

A candidatura que não desiste de Portugal e que, com toda a determinação e confiança, luta por um Portugal democrático, justo, solidário e desenvolvido. Daqui dizemos e apelamos aos trabalhadores, ao povo português que contamos com o seu apoio, daqui lhe garantimos que podem também contar com esta força de luta, que continua a manter bem a bandeira da esperança e da confiança por uma vida melhor para os portugueses!

O voto em Francisco Lopes nunca será um voto nem perdido nem traído! E quando dizemos ao camarada para avançar, avançamos com ele e a seu lado, juntos pelo nosso ideal e projecto, onde reside e irradia a nossa força!

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